Gambozino é uma animal imaginário.
Andar aos gambozinos, significa andar à toa, vaguear, vadiar, vagabundear.
É isto que eu prendendo: vaguear por vários assuntos, vários lugares, ao correr da imaginação e da disposição.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Mês de Orlando Ribeiro

"A taipa na expansão portuguesa
Pela facilidade e rapidez da construção, a taipa teve larga fortuna na expansão portuguesa. Nas regiões tropicais húmidas, em virtude da alteração profunda das rochas, o barro é material quase tão usado como a madeira. Na África tropical e na América, o emprego generalizado do pilão facilitou a transmissão desta técnica às populações indígenas. É provável que a difusão da taipa esteja ligada ao predomínio da gente do Sul que, entre outros indícios, o próprio parentesco entre o português do Brasil e os falares meridionais, geralmente admitido pelos filólogos, parece indicar. (...)
Ao acaso de leituras e observações, como achegas para um estudo sistemático deste importante assunto, juntam-se alguns exemplos da difusão da taipa em três partes do mundo.
Conta Diogo Gomes, criado do Infante D. Henrique e navegando por conta dele (meados do século XV), que certo rei da Gâmbia lhe pedira um sacerdote e um fidalgo que o instruíssem na fé cristã, um açor ("uma ave que apanha as outras aves", coisa que muito o maravilhara), vários animais domésticos e "dois homens que soubessem fazer casas e cercar sua cidade de taipa"; as casas do lugar eram "feitas de canas marinhas cobertas de colmo" e é provável que o chefe indígena visse a rapidez e a segurança com que os Portugueses se abrigavam detrás das muralhas construídas daquele modo. (...)  (Em Angola) o monte de São Miguel, que defendia Luanda, depois de precariamente protegido por uma barricada de pipas de areia, foi fortificado "de barro, taipa e adobes" nos meados do século XVII; revestiu-se depois essa obra de alvenaria, mas ainda se fizeram de taipa mais um baluarte e uma cortina de muralha.
O uso da taipa foi levado para Goa, onde concorre com o barro amassado à mão em faixas sobrepostas, geralmente empregado nas casas hindus. O processo tem em concanim um nome de origem portuguesa - taip - que não deixa qualquer dúvida sobre a sua introdução. Seriam de taipa todas as casas humildes de Velha Goa; quando o aumento da tonelagem dos galeões e o fim da supremacia naval portuguesa no Índico, no século XVII, provocaram o declínio do porto e com ele o da gloriosa e opulenta cidade, esta começou aos poucos a ser abandonada. Derruídos os telhados, as paredes de taipa não resistiram à violência das chuvas de monção, ao passo que as de pedra (laterite) foram exploradas, como uma sorte de "pedreiras" de cantaria, para as construções de Pangim e de Margão; ainda hoje se vê, na área das ruínas da velha cidade, muita laterite aparelhada nos muros de propriedades rústicas. As casas de taipa reverteram lentamente ao barro de que eram feitas e, arrastadas pelas enxurradas, delas não resta qualquer vestígio. Isto explica o estranho aspecto que conserva a grande cidade, reduzida a pouco mais que os edifícios religiosos, uns preservados, outros em ruína. Mas a taipa já antes havia sido empregada no Oriente e com ela se levantariam as muralhas das primitivas feitorias. (...)
O mesmo processo de construção foi usado em Macau: "muro de taipa" da cidade, muro do forte de S. Paulo, com alicerces de pedra e, a seis palmos do chão, "só de terra a qual misturada com alguma palha e batida com batedores tão fortemente que fica fortíssimo..."
O emprego da taipa era geral no Brasil, substituindo, quando um estabelecimento ganhava importância e se consolidava, o das palhotas. Foi o que sucedeu em Olinda por 1537. (...) Os jesuítas ensinaram os índios a servirem-se da taipa na construção de São Paulo, quando fundaram a cidade (1554); assim se levantaram as primeiras casas e os muros que defendiam a aglomeração. Nos princípios do século XIX, a maioria das habitações, tanto térreas como de andar, eram "construídas de taipa muito sólida"; o processo divulgara-se tanto que era geral no interior dos estados de São Paulo e de Goiaz. (...) Nos arredores da grande metrópole, inteiramente refeita nos últimos anos, podem ver-se, como relíquia cuidadosamente conservada pelo serviço do património histórico, os restos da igrejinha seiscentista de São Miguel, cujas paredes foram construídas desse modo."

Orlando Ribeiro. Geografia e Civilização. Temas Portugueses. Lisboa: Livroz Horizonte. pp.42-44

2 comentários:

Rafael Carvalho disse...

Parece que no norte do país, apenas existem vestigios do uso da taipa em Viana do Castelo. Este processo construtivo foi para mim durante muito tempo desconhecido. Na região de Aveiro, de onde sou natural, era muito usada outra técnica da construção em terra - o adobe.
Cumprimentos.

Luiz Alexandre disse...

A chuva leva a taipa e deixa o granito. Escassos são os vestígios de construções nos lugares onde não havia pedra. Mas isso não significa que não houve gente.

A escrita do Mestre é uma lição de literatura.